É fato que o ser humano é a espécie mais evoluída do planeta. Estamos no topo da cadeia alimentar, enquanto o resto do reino animal se mantém no espaço que sobra ou que é preservado para eles.

Quando observamos esses outros animais de inteligência menos complexa vimos conflitos e lutas por sobrevivência sem que se notasse reações de rancor ou vingança entre eles. O motivo disso é explicado pelo psicólogo Helder Kamei como uma capacidade humana que nos leva a reviver, ressentir, ruminar os pensamentos enquanto nos outros animais esse comportamento só existe em relação a alimentos, por exemplo o boi e a vaca ruminam o pasto, que significa mastigar inúmeras vezes o capim antes de engoli-lo.

No comportamento humano se observa a ruminação em relação a acontecimentos onde há inconformidade, fixação ou descontentamento. Um único trauma pode ser revivido milhares de vezes, causando no corpo nova descarga de tensão e estresse em cada vez que rememora.

As divisões do cérebro

O neurologista Paul McLeon criou uma divisão evolutiva no cérebro humano, onde a primeira parte, mais primitiva seria a reptiliana, responsável por nossas funções fisiológicas e instintivas como comportamento de luta ou fuga. Por exemplo aquela pessoa que toma um susto e empurra no impulso a outra, ou alguém que enfrenta um cachorro furioso, enquanto outro alguém grita e corre do susto, se encolhe diante do cachorro.

Com a evolução uma segunda camada mais elaborada se somou ao córtex, é o sistema límbico responsável pelas emoções. Essa região contém a amígdala cerebral onde nossos hormônios positivos e negativos são disparados em forma de emoções (mais comuns são alegria, tristeza, amor, raiva, medo e nojo).

Todos mamíferos são equipados com o sistema límbico e emoções. Ou seja, assim como os humanos, os cachorros e gatos também sentem raiva, medo, amor. Contudo, desenvolvemos uma terceira camada evolutiva no córtex, chamada neocórtex que envolve as outras duas primeiras estruturas e é quem diferencia nossa racionalidade nos permitindo construir inteligência emocional, pensamento abstrato, motricidade fina, memórias de longo prazo, entre outras tantas habilidades unicamente humanas. Entre elas a capacidade de manter ressentimento e também a capacidade de decidir perdoar. Porque somente quem mantém a memória do trauma precisa decidir se libertar dele. Assim, o perdão inicia por uma decisão racional e pode ou não chegar a fase emocional e transformar o sentimento negativo ligado ao trauma em um sentimento positivo.

O que acontece com nosso corpo quando nutrimos mágoa, e não perdão.

Para entender melhor os motivos para além da dádiva altruísta é importante considerar que a cada rememoração de trauma o corpo responde produzindo cortisol (que é o hormônio do estresse, evolutivamente útil para nos permitir responder com aumento de potência muscular através de maior irrigação sanguínea para luta e irrigação cardíaca para fuga, quando há um risco agudo o cortisol nos auxilia na resposta rápida e adaptativa). Contudo, quando há imaginação constante do risco, o cérebro que não consegue diferenciar o real do imaginário dispara o mesmo cortisol e com isso vai tensionando o corpo, intoxicando o organismo e causando sensação de desconforto e insatisfação que pode advir do estresse crônico, causando inúmeros prejuízos à saúde, dentre eles o risco de vida.

Ele é problemático porque se repete com frequência, assim, Kamei ao comentar essa teoria explica que a mágoa é tão prejudicial porque ela se mantém ao longo do tempo, promovendo a manutenção da dor.

Mágoa = má água

Do ponto de vista semântico a palavra mágoa é entendida como uma “má água”. Como um tipo de água parada que fica acumulada e apodrece dentro de quem a mantém. Ora, se o corpo humano é composto quase todo por carbono e água (vale a pena ler o artigo que escrevi sobre os 4 compromissos) sendo 23% carbono e 55% água e se considerarmos a teoria de Masaru Emoto com seu estudo sobre as moléculas de água se modificarem conforme as palavras ou até a música que as envolve, concluindo que o que é positivo torna a água mais qualificada, enquanto o que é negativo torna as moléculas disformes.

Se a teoria se confirmar, imagine o efeito da mágoa (má água) no seu corpo composto 55% por água. Se por acaso nada disso puder ser cientificamente comprovado, ainda que eu particularmente acredite, quero tratar também sobre algumas pesquisas validadas a seguir.

Pesquisas validadas sobre o perdão!

O pesquisador Michael McCullough afirma que o perdão é um comportamento adaptativo que foi perpetuado pela seleção natural, assim como a vingança. Ele escreveu o livro “Além da vingança: a evolução do instinto de Perdão” (2008).

Na pré história a chance de vida era maior em bandos e por isso, mesmo com problemas entre os integrantes a segurança apontava para o perdão como forma de manter todos unidos e aumentar as chances de sobrevivência.

Em todos estudos aparecem pressupostos como evitação e vingança, ressentimento e mágoa como pano de fundo na ideia de que quem mantém um ressentimento, repete o que sente e no caso é um sentimento negativo, uma mágoa.

Teste das 12 afirmações

Michael McCullough desenvolveu uma escala simples com 12 afirmações que adaptei para trazer e traduzir aqui, através das quais podemos notar o quanto estamos longe ou próximos de perdoar alguém. Se quiser testar, pense em uma pessoa que te prejudicou. A proposta é você saber o nível de evitação ou disposição para vingança que sente para cada afirmação pontue de 1 a 5 (1 = discordo muito; 2 = discordo; 3 = neutro; 4 = concordo 5 = concordo muito).

  1. Farei a pessoa pagar;
  2. Mantenho a maior distância possível entre nós;
  3. Gostaria que algo de ruim lhe acontecesse;
  4. Vivo como se ela não existisse, mesmo se está próxima;
  5. Não confio nela;
  6. Quero que ela tenha o que merece;
  7. Tenho dificuldade de agir de forma carinhosa com ela;
  8. Evito essa pessoa;
  9. Vou acertar as contas com ela;
  10. Rompo o relacionamento com ela;
  11. Quero vê-la prejudicada e infeliz;
  12. Afasto-me dela.

Resultados para pessoas que pontuaram entre 0 a 20 você perdoa facilmente, logo terá superado o que passou e até pode sentir carinho pela pessoa.

Entre 20 a 40 você está um pouco evitativo, mas vai superar e com o tempo pode sentir carinho pela pessoa.

Entre 40 a 60 você está sob efeito do ressentimento e mágoa, evitando e considerando vingança, esse sentimento pode trazer prejuízos ainda maiores para você, pense no perdão. Se já sente os prejuízos, busque ajuda.

Como alternativa de técnica gostaria de encerrar nossa conversa indicando:

Os 9 passos para o perdão, de Fred Luskin, da Universidade de Stanford

  1. Tomar consciência da dor, do problema e para além do sentimento, elaborar a razão do erro na situação. Depois elabore frases de experiências com pessoas que confia;
  2. Assuma um compromisso com você para fazer o melhor para si mesma;
  3. Busque a paz na compreensão que vem de encarar a experiência vivida de forma menos pessoal, mudando a narrativa da mágoa. Perdoar nem sempre é se reconciliar, nem tolerar o ato sofrido ou deixar de buscar justiça. Apenas se decide apaziguar;
  4. Coloque em perspectiva. Se conscientize de que está ruminando o sofrido. Já passou. Seguir ressentindo causa prejuízos a sua saúde;
  5. Gerencie o estresse. Quando sentir irritabilidade ou raiva estabeleça para você alguma técnica. Pode ser respiração diafragmática, mindfulness, contagem, visualização, oração, amuleto, etc. Isso varia conforme traços pessoais;
  6. Abandone as expectativas que envolvem aos outros e direcione suas expectativas a você. A sua saúde, prosperidade, amor, paz;
  7. Busque novos caminhos. De preferência, em vez de reprisar mentalmente o sofrimento, busque jeitos novos para atingir suas metas, direcione a energia para você;
  8. Assuma o poder. Uma vida bem vivida é a melhorar e revanche possível. Ao invés de viver com mágoa que mantém o outro com poder sobre sua paz, aprenda a reconhecer amor e bondade ao seu redor. Perdão é poder pessoal;
  9. Seja heroica: uma pessoa que reformula sua narrativa de dor e se destaca como capaz de perdoar é mais forte e mais feliz.

8 Responses

  1. Maravilhoso teu artigo Aline!!! Quem não tem ou teve um desafeto e precisa rever o sentimento por tal situação? Precisamos ficar em paz, perdoar e viver melhor. Obrigada pelas dicas.

  2. Gostei demais da tua abordagem deste assunto, tão importante, sobre o perdão! Parabéns filhotinha.
    Vou reler teu texto e exercitar todos os pontos enumerados, a fim de me aprofundar na matéria, pra então opinar com mais conhecimento!

    • Também amamos a forma como a Aline abordou esse assunto e concordamos muito com isso! O perdão é uma das chaves para viver uma vida mais feliz.

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